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Aposentadoria Especial e PEC 287/2016: Um Tiro no Coração


aposentadoria

O título parece apelativo. Contudo, reflete exatamente o que traz a PEC 287/2016, texto da reforma previdenciária proposta pelo Governo Federal, em relação a esta espécie de benefício. Nesse artigo, explicaremos o que a alteração no 201, §1º, II da Constituição Federal e o artigo 13 da PEC acabam por fazer com a aposentadoria de cidadãos contribuintes que laboram sob condições prejudiciais à saúde ou integridade física.

Em que pese tratar-se de benefício com fonte adicional própria de custeio, bem como ter como destinatários um percentual pequeno de segurados (sofridos pelo desgaste de suas profissões), em comparação aos demais tipos de aposentadoria, o benefício da aposentadoria especial acabou sendo o mais atingido no texto proposto pelo Governo Federal. Isso é percebido, desde logo, pela inexistência sequer de regra de transição a garantir o valor diferenciado que existe atualmente para este benefício.

Veja-se que as aposentadorias comum, rural e do professor tiveram uma previsão de regra de transição. Contudo, o mesmo não ocorreu com a aposentadoria especial. Simplesmente não foi ofertada nenhuma regra de transição para este tipo de benefício (B46). O segurado que labora sob condições especiais, independentemente do tempo que já esteja trabalhando, estaria sem proteção transitória alguma pela proposta de Emenda Constitucional 287/2016, num claro prejuízo desproporcional à expectativa de direito.

Sem regra de transição, o segurado examina a regra geral a que estará sujeito. E esta dispõe no art. 201, §1º:

II - cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que efetivamente prejudiquem a saúde, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação.

§1-A- Para os segurados de que tratam os incisos I e II do § 1º, a redução para fins de aposentadoria, em relação ao disposto no § 7º, será de, no máximo, dez anos no requisito de idade e de, no máximo, cinco anos para o tempo de contribuição.

E assim, o indivíduo descobre que poderá ter, na verdade, um mero desconto na idade e tempo de contribuição, de, no máximo, dez e cinco anos, respectivamente.

O objetivo da aposentadoria especial era justamente proporcionar uma retirada antecipada do trabalho, a fim de que o segurado pudesse ausentar-se antes de ocorrido dano efetivo à saúde. Era, portanto, uma proteção pelo risco da atividade exercida. Exemplo maior de todos são os mineradores, que possuem baixíssima expectativa de vida por sua atividade extremamente insalubre, e que podiam ter acesso ao benefício após tempo reduzido de trabalho.

Ao ser imputada idade mínima para este benefício, repetindo, que possui financiamento diferenciado, está a se desvirtuar sua essência, seu coração (daí o título escolhido). Na aposentadoria especial, o foco está apontado para a proteção à saúde ou integridade física. Por tal razão, na aposentadoria especial, não há idade mínima, pois a inativação é calculada com base no desgaste da atividade exercida.

Incluir idade mínima para este tipo complexo de benefício irá ocasionar aumento dos problemas de saúde dos trabalhadores. É, portanto, é algo inaceitável, já que anos de evolução jurídica em se tratando de proteção aos riscos à saúde estão sendo desvirtuados.

E não é somente com a questão da idade mínima: o texto da PEC 287 também não merece ser aceito, pois altera o requisito base para obtenção do benefício de aposentadoria especial. Ao invés das condições nocivas à saúde ou integridade física como era anteriormente, o projeto traz a necessidade da atividade "efetivamente" prejudicar à saúde.

A legislação evoluiu de forma a garantir o descanso precoce em relação a segurados que exercem atividades nocivas, como forma de preservação da saúde dos trabalhadores. A ideia era permitir a inativação antecipadamente, prevenindo ou minorando danos. Com base nisto, criou-se toda uma sistemática para a aposentadoria especial, inclusive com incremento em custeio. De outro lado, o valor do benefício não recebia, por exemplo, a incidência do fator previdenciário, também dentro da ideia de compensar o labor desgastante.

A aposentadoria especial é, assim, espécie de aposentadoria diferenciada. A proteção à impossibilidade, incapacidade ou dificuldade laboral futura, fundamentos desse sistema de proteção social que chamamos de Previdência, encontra na aposentadoria especial um diferencial relativo ao ambiente hostil (tanto perigosos, como prejudiciais à saúde).

Esse ambiente, seja perigoso, insalubre ou penoso é que vai submeter o ser humano a diferentes tipos de exposição maléficas, as quais demandam um tratamento previdenciário diferenciado. Não se trata de privilégio, mas apenas do reconhecimento de uma realidade incomum. Tão incomum que a aposentadoria especial responde por porcentagem ínfima em relação ao número geral de benefícios concedidos, fato que já mencionamos.

Diante desse quadro, o legislador anterior elegeu que o meio nocivo seria suficiente para gerar a compensação que traz esse tipo de aposentadoria. E considerou, também, uma realidade prática: não é viável medir no ser humano efeitos concretos à saúde diante da exposição aos agentes maléficos. Por isso, a utilização do termo "efetivamente", que teria como consequência impor ao segurado a prova do efeito dos agentes nocivos em seu corpo, não pode ser aceita.

Não há como, por exemplo, um cidadão fazer a prova do que ocorre em seu corpo diante da exposição diária a agentes químicos, a agentes biológicos, a temperaturas diferenciadas, etc. A ciência, com dificuldade, consegue determinar, por exemplo, que um agente é nocivo à saúde do homem. Contudo, o efeito do agente no indivíduo, concretamente, pode variar em tempo, intensidade e até em qual doença será desenvolvida.

Em outras palavras, a comprovação pelo indivíduo dos males que o agente causou irá praticamente acabar com a aposentadoria especial (que passou a ser esse desconto na idade e tempo de contribuição), pois fica impossível, na maioria dos casos, fazer tal comprovação. A sabedoria do texto anterior residia exatamente em considerar essa dificuldade e avaliar o ambiente em si, permitindo a existência do benefício de forma equitativa, o que não ocorrerá com a manutenção da expressão "efetivamente" no texto da PEC 287/2016.

Citando um exemplo concreto (poder-se-ia dar centenas de exemplos): um segurado exposto ao agente químico benzeno. Comprovadamente, este agente químico aumenta a incidência de câncer entre os trabalhadores expostos continuamente, além de outras complicações de saúde (algumas ainda em estudo, como é o caso da fertilidade, por exemplo). Pergunta-se: apenas o cidadão que desenvolver a citada doença no momento de sua aposentadoria terá direito ao benefício? Como medir os efeitos tóxicos que estão ocorrendo em seu corpo com o passar dos anos, caso ainda não tenha desenvolvido sintoma agudo? E, mesmo se desenvolver doença, como comprovar que há efetiva relação entre agente nocivo a doença desenvolvida especificamente?

Vê-se que não faz o menor sentido a inclusão do termo "efetivamente" no texto constitucional. Além de desvirtuar o benefício da aposentadoria especial, deslocando-o de proteção ao risco para próximo da aposentadoria por invalidez, já que a proteção será ao dano, está praticamente inviabilizando sua concessão. Na prática, a extrema maioria dos segurados não conseguirá o benefício. Pessoas que sofreram exposições a agentes nocivos ficarão sem o benefício a que, em princípio, teriam direito, por não terem desenvolvido alguma doença no tempo previsto. Outras, de outro lado, desenvolverão doenças por terem que se submeter por mais tempo a condições insalubres, mesmo assim com o risco de não terem o reconhecimento da relação entre atividade desenvolvida e o dano à saúde.

O texto anterior da Constituição Federal apenas trazia a previsão "atividades exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física". Não há motivo para alterá-lo. Se a atividade se dá em condições que prejudicam a saúde, são essas condições que devem ser avaliadas, e não o organismo humano a estas submetido. Não há outra possibilidade, pois as condições podem ser objetivamente descritas, tornando o benefício de aposentadoria especial viável e possível, o que não ocorrerá se dependermos da análise em cada indivíduo. Vê-se que, pela PEC, a proteção à integridade física também foi retirada, comprovando que a nova redação tem mesmo o objetivo de trocar a proteção ao risco da efetividade pela compensação em caso de efetivo dano. (A legislação deixa de ser preventiva para ser retributiva).

E não parou por aí o Governo Federal em seu texto de alteração constitucional. Foi mais além, vejamos:

Art. 13. É assegurada, na forma da lei, a conversão de tempo ao segurado do regime geral de previdência social que comprovar tempo de contribuição na condição de pessoa com deficiência ou decorrente do exercício de atividade sujeita a condições especiais que efetivamente prejudiquem a saúde, cumprido até a data de promulgação desta Emenda.

Acima, no artigo 13 das regras apartadas, que envolve a conversão do tempo especial em comum (muito utilizada por trabalhadores que não permanecem no labor especial por todo o tempo necessário para aquela espécie de aposentadoria), acabaram por estender a regra nova ao tempo anterior. É a ofensa clara ao direito adquirido dos segurados e ao princípio do tempus regit actum. Se o labor exercido gerava direito à conversão futura, não pode a norma retroagir e modificar o que já incorporou-se ao patrimônio jurídico do segurado.

Ao supostamente assegurar o direito à conversão do tempo especial em comum (direito que já existe no sistema previdenciário), o texto está, na verdade, a contrário sensu, proibindo a conversão de quem não possui prova do efetivo dano à saúde, mas labora em condições especiais nocivas à sua saúde ou integridade física. Isto não poderia ocorrer, pois se está impondo exigência nova para conversão de tempo pretérito.

A exigência do efetivo prejuízo à saúde, se aprovado, o que não se espera, apenas poderia valer para o período posterior à publicação da emenda; a retroação disfarçada, que está a se pretender no texto original da PEC 287/2016, viola o direito incorporado já pelos trabalhadores.

Por estas razões, não se espera que texto tão prejudicial a trabalhadores sujeitos a condições nocivas, hostis, perigosas, seja aprovado. Não há motivos para tamanha redução de direitos previdenciários a este conjunto de homens e mulheres que, em minas, hospitais, fábricas, etc. estão colocando-se em risco e contribuindo para o crescimento do país e de toda a sociedade.

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